“Eu acho que os jornalistas
precisam, antes de tudo, ter humildade e autocrítica”, opina Pedro Burgos,
editor do site The Marshall Project, creditando parte da responsabilidade no
cenário de informações deturpadas aos profissionais de imprensa. A pressão por
escrever mais reportagens, “mais superficiais, sem o tempo para checagem dos
fatos”, a promoção de manchetes sensacionalistas que não entregam o que a
matéria descreve, o uso excessivo de fontes anônimas ou de partes interessadas
são realidades que, segundo ele, contribuíram para que 2016 fosse um ano de
meias verdades.
“Há muita pós-verdade no
jornalismo diário, há muito tempo”, afirma Burgos, propondo uma inversão na
métrica do sucesso empresarial: ao invés de se preocupar com o número de
cliques ou jornais vendidos, o importante seria avaliar o impacto real das
reportagens. Essa troca de propostas aparece como uma das saídas para a perda
de credibilidade que os grandes veículos - assim como instituições medulares
como Igreja e Governo - vêm enfrentando.
Rogério Christofoletti,
professor da UFSC e coordenador do Observatório da Ética Jornalistica, acredita
que é fundamental para os jornais buscar formas de reatar o antigo pacto com
seu público. “As pessoas não confiam tão cegamente nos meios de informação como
confiavam antes. Os cidadãos agora podem comparar versões e perceber erros ou
distorções nos relatos”, afirma.
Christofoletti também critica
a postura “paternal e até mesmo arrogante” de algumas redações, atitude que não
combina com essa tentativa de repactuação. “Quando os públicos passaram a ter
acesso a fontes que antes não tinham, perceberam que às vezes podem prescindir
de intermediários, e o jornalismo sempre atuou como intermediário”, afirma ele,
avaliando que um resgate de confiança pode partir de dois pontos: diálogo e
transparência.
E muito pode ser apreendido
das redes sociais antes de vê-las como vilãs universais no processo de
descrença com o jornalismo - desde que este não tente emulá-las. “Os públicos
querem atenção, desejam participar, querem ser ouvidos. O jornalismo pode usar
as redes como recursos dessa aproximação, traçando estratégias para engajar as
audiências, dialogar com elas. Isso diz respeito a relacionamento”, explica.
Mas nem tudo está perdido
para os grandes jornais. Após a vitória de Trump, os maiores veículos dos
Estados Unidos registraram inesperada alta no número de novos assinantes. O The
New York Times ganhou 41 mil novos subscritos na semana seguinte à eleição do
republicano, e o The Wall Street Journal viu sua quantidade de novos assinantes
diários dobrar. “A lógica é que pra basicamente metade da população, um
jornalismo combativo seria ainda mais importante durante o mandado de Trump.
Essas pessoas confiam bem mais no jornal do que no político”, avalia Burgos.
Quando se fala de
transparência e relacionamento como elementos para o resgate da confiança,
também vêm à tona outras experiências da grande mídia. A BBC, por exemplo, não
se furta a explicar ao seu público que não detém a totalidade das informações
sobre determinados fatos. Não é difícil ver, durante coberturas, repórteres
assumindo que ainda estão em processo de investigação. O The Guardian, por sua
vez, disponibilizou recentemente um banco de dados feito a partir dos
comentários de seus leitores.
2016 chega ao fim como o ano
em que nem tudo o que parece é, em que o que reluz nem sempre é ouro. Se
enfrenta sua maior crise, o jornalismo também tem pela frente um sem fim de
oportunidades para provar sua relevância -que, como concordam os especialistas,
é cada vez maior. O papel da profissão e do profissional não mudou, ainda é o
de informar bem e com responsabilidade. “Devemos insistir em mostrar que o
jornalismo continua a ser um fator determinante para que as pessoas entendam
seu tempo e para que possam tomar suas decisões de forma mais segura”, conclui
Christofoletti.
“Se enfrenta sua maior crise,
o jornalismo também tem pela frente um sem fim de oportunidades para provar sua
relevância ”
Rogério Christofoletti,
Coord. Observatório da Ética Jornalística.
Via Jornal O Povo Online.
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